quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

O ESTADO POR TRÁS DO iPhone

Em seu conhecido discurso na Universidade de Stanford, proferido em 12 de junho de 2005, Steve Jobs, então CEO da Apple Computer e da Pixar Animation Studios, incentivou os formandos a serem inovadores, "indo atrás do que vocês amam", e "continuando loucos". (...) Embora o discurso seja inspirador e apesar de Jobs ter sido corretamente chamado de "gênio" pelos produtos visionários que concebeu e comercializou, essa história cria um mito em relação à origem do sucesso da Apple. A genialidade individual, a atenção ao design, o gosto pela jogo e a loucura foram sem dúvida características importantes. Mas sem o maciço investimento público por trás das revoluções da informática e da internet, esses atributos poderiam ter levado apenas à invenção de um novo brinquedo - e não a produtos revolucionários como o iPad e o iPhone, que mudaram a maneira como as pessoas trabalham e se comunicam. (...) a genialidade e o "espírito louco" de Steve Jobs só produziram sucesso e lucros maciços porque a Apple conseguiu surfar na onda de investimentos enormes feitos pelo Estado em tecnologias "revolucionárias" que deram sustentação ao iPhone e ao iPad: a internet, o GPS, telas sensíveis ao toque [touch-screen] e tecnologias de comunicação. Sem essas tecnologias financiadas com recursos públicos, não teria havido nenhuma onda para surfar tolamente. (...) porque o Estado não é recompensado pelos investimentos diretos em pesquisa básica e aplicada que levam a tecnologias bem-sucedidas e servem de base para produtos comerciais revolucionários como o iPod, o iPhone e o iPad? (MAZZUCATO, Mariana. O Estado Empreendedor, págs. 126-127)

sábado, 17 de janeiro de 2015

O ESTADO NÃO TEM DIREITO DE MATAR

Não é porque Marcos Archer Moreira é brasileiro que eu gostaria que o governo da Indonésia lhe concedesse clemência. Torço por essa possibilidade – mais remota, a cada minuto que passa – porque sou radicalmente contra a pena de morte. Em toda e qualquer circunstância.
Marcos fez uma besteira das grossas. Ingenuamente, acreditou que poderia camuflar 13 quilos de cocaína na sua asa-delta. É obviamente um mané. Nem por isso merecia o castigo de uma punição extrema.
Fico imaginando o que deve ter sido um julgamento desses. Sete juízes – adivinho – decidindo, com seus trajes ridículos e sua retórica agressiva, o destino de um ser humano.
Insisto: o Estado, representado por seus fantoches, não tem o direito de matar. Torna-se um facínora igual aquele que pretende punir. Podem argumentar: mas a droga pode ser mortífera, e o Estado tem de ser rigoroso no seu controle. Ainda assim, nada justifica a brutalidade de um fuzilamento. É um recurso arcaico, autoritário, anti-civilizatório. Reparem na lista dos países que insistem na pena capital: a Arábia Saudita, o Irã, o Vietnã, o Paquistão e, claro, os Estados Unidos, um país que parece viver no passado fantasioso do faroeste bandido vs. mocinho.
A América é hoje um país da violência lícita e gratuita. A brutalidade virou espetáculo. Não me surpreende que haja plateia risonha e excitada para, no Texas, em Utah, no Nebraska, assistir prisioneiros estrebuchando ao receberem injeções letais. 
Só um país mata mais do que os Estados Unidos: a China. Também na China o método de execução sumária é o fuzilamento. Não é algo de que se orgulhar.(Nirlando Beirão, em seu blog no R7).

quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

Patrimonialismo capitalista desvelado na fiscalidade

Entre 1995 e 2011, o Estado brasileiro transferiu para os detentores da dívida pública, sob a forma de pagamento de juros reais, um total acumulado de 109,8% do PIB. Se avançarmos até 2014, essa transferência de renda e riqueza chega a 125% do PIB. Isso significa atirar ao colo dos detentores de riqueza financeira, ao longo de 19 anos, um PIB anual, mais um quarto. É pelo menos curioso que os idealizadores do “impostômetro” não tenham pensado na criação do “jurômetro”.
É possível alinhavar algumas cifras para apontar os perdedores e ganhadores do jogo. Para tanto, vou recorrer ao excelente estudo da professora Lena Lavinas,  A Long Way from Tax Justice: The brazilian case.
Nesse caso, como em outros, há brasileiros e brasileiros. Em 2011, a carga tributária bruta chegou a 35,31% do PIB. No Brasil os impostos indiretos, como o IPI e o ICMS, representam 49,22% do total da carga tributária. Como se sabe, esses impostos incidem sobre os gastos da população na aquisição de bens e serviços, independentemente do nível de renda. Pobres e ricos pagam a mesma alíquota para comprar o fogão e a geladeira, mas o Leão “democraticamente” devora uma fração maior das rendas menores. Os chamados encargos sociais representavam 25,76% da carga total e o ônus estava, então, distribuído entre empregados e empregadores.
Já o Imposto de Renda contribui com parcos 19,02% para a formação da carga total, enquanto os impostos sobre o patrimônio são desprezíveis, sempre empenhados a beneficiar a riqueza imobiliária e financeira dos mais ricos. As estimativas sobre a distribuição da carga tributária bruta por nível de renda mostram que ,enquanto os que ganham até dois salários mínimos recolhem ao Tesouro 53,9% da renda, os que ganham acima de 30 mínimos contribuem com 29,0%. “A quem tem, mais se lhe dará, e terá em abundância; mas, ao que quase não tem, até o que tem lhe será tirado.” Feliz ajuste fiscal.(Belluzzo, Carta Capital, qua, 14/01/2015)

terça-feira, 6 de janeiro de 2015

ESTADO EMPREENDEDOR

O Estado ... "tolamente" desenvolvendo inovações? Sim, a maioria das inovações radicais, revolucionárias, que alimentaram a dinâmica do capitalismo - das ferrovias à internet, até a nanotecnologia e farmacêutica modernas - aponta para o Estado na origem dos investimentos "empreendedores" mais corajosos, incipientes e de capital intensivo. E, (...), todas as tecnologias que tornaram o iPhone de Jobs "inteligente" [smart] foram financiadas pelo governo (internet, GPS, telas sensíveis ao toque [touch-screen] e até o recente comando de voz conhecido como SIRI). Tais investimentos radicais - que embutiam uma grande incerteza - não aconteceram graças a investidores capitalistas ou "gênios de fundo de quintal". Foi a mão visível do Estado que fez essas inovações acontecerem. Inovações que não teriam ocorrido se ficássemos esperando que o "mercado" e o setor comercial fizessem isso sozinho - ou que o governo simplesmente ficasse de lado e fornecesse o básico. (MAZZUCATO, Mariana. O Estado Empreendedor. pág. 26)